sexta-feira, 10 de maio de 2019

Dom Quixote de la Mancha


Por Gabriella Gilmore

Desculpe amantes de Dom Quixote, mas esta critica não é sobre vocês.
Bom, eu achei o Dom Quixote uma mistura de mau gosto de Pollyanna com um paciente esquizofrênico em crise de abstinência dos remédios controlados.
Ele é um megalomaníaco, fanfarrão, que pensa que o mundo é do jeito que ele quer que seja, e se enfurece quando as pessoas não entram na sua "estória".
Ele usa dessa loucura para fazer essa aventura em sair pelo mundão “ajudando” as pessoas, viagem um tanto pretensiosa e delirante, nos mostrando o lado perigoso e flagelante da imaginação desgovernada.
Quixote se vangloria o tempo todo falando que sua missão é desfazer violências e socorrer os miseráveis, mas em grande parte da história ele está agredindo aqueles que não entram em sua fantasia, ou aqueles que o chamam de louco. (Por acaso ele é normal a ponto de ficar ofendido com a nomenclatura de maluco?)
Mostra uma inversão de valores quando na cena da conversa com o padre, que o repreende para que Quixote volte a si, para a realidade, e Quixote se defende falando que os padres não deveriam falar com as pessoas daquela forma, colocando o papel do padre como de uma pessoa preconceituosa, só pelo fato do mesmo está sendo sincero e conselheiro. Mas francamente, o padre fez mais que o seu papel em alerta-lo sobre um excesso que estava fazendo mal para o próprio Quixote, que vivia uma vida lastimável, passando fome, frio e risco de vida sem um real propósito.
Talvez uma das partes mais coerentes da história é quando o Duque resolve pregar peças em Sancho, e assim, Sancho e Quixote, provam do próprio veneno da imaginação descontrolada e autodestrutiva que é viver uma vida de fantasia sem uma finalidade, e nos passa uma mensagem de que para você acalmar um “doente mental”, você precisa dançar conforme sua música(loucura), e foi  assim que Sansão conseguiu enganar Quixote para fazer com que o mesmo voltasse para casa.
E uma pergunta eu deixo para você: O que o autor quis dizer com aquela cena final quando Quixote reconhece sua insanidade e passa a ser lúcido novamente? Por quê que é só no final de sua vida, que Quixote reconhece a imbecilidade de ter alimentado uma imaginação de forma tão degradante como ele o fez em grande parte de sua vida?
Bom, eu gostaria mesmo de tentar entender o que fez dessa história ser um clássico premiado, e quase que uma leitura “obrigatória” nas escolas. É, eu devo ser muito ignorante mesmo, pelo fato de não dançar conforme a música de uma sociedade totalmente mecanizada...

segunda-feira, 17 de abril de 2017

Sobre "Thirteen Reasons Why"


Eu queria começar essa conversa perguntando a você que me lê: quantas vezes você escondeu uma vontade imensa de chorar num "Estou bem!"? E quantas vezes o outro foi sem a menor noção do quanto você está desesperado por um "Não está não!"? Ninguém é culpado por não adivinhar o que REALMENTE você está sentindo. Adivinhar não é uma coisa natural ao ser humano. Então, faço uma segunda pergunta: Quantas vezes você se coloca no lugar do outro antes de dar a ele um apelido pejorativo ou até mesmo fazer uma brincadeira que você considera inocente? Quase nunca, não é? A gente não costuma pensar se o riso do amigo é real e de boa ou é só para fingir uma descontração. Pois é, não dá para saber como nossas palavras atingem o outro e menos ainda como todo o resto correrá dali em diante. Eu, como todos sabem, sou gorda, sou baixinha, sou dentuça, sou bunduda... Enfim, tenho "n" dessas coisinhas que viram comentário, brincadeiras, piadinhas, apelidos... E houve uma época que eu me escondia atrás do jeans e das camisetas largonas, dos livros, do meu quarto estranhamente decorado de preto. "Preto emagrece!" e eu uso preto na maior parte do tempo até hoje, mesmo não me importando mais. É como uma tatuagem, sabe? Mas isso acontece aí todo dia. Esses jogos de ofensa, de brincadeiras perversas, de sorridentes ofensas. Principalmente os adolescentes que ainda estão tão desligados e despreparados para entender olhares e limites. Deram a isso o nome de "Bullying". A violência física, psicológica ou moral repetidas a alguém. Mas aí dirão: antes isso era só zoação, a modernidade é que dramatizou tudo. Será? Será que nós não carregamos em nós aquele "traumazinho" escondido embaixo de nossa pseudo-confiança? Será que não cobramos que nossas crianças sejam magrinhas e lindas porque na nossa infância ou adolescência fomos chamadas de "canhão" ou "dragão"? Quase ninguém admitiria isso. Somo adultos, na grande maioria, com frustrações escondidas, paranoias camufladas em "pans" sedativos. Mas quem vai arrancar isso de você quer você tenha sofrido o tal Bullying quer você tenha praticado. Ninguém gosta de encarar o feio. Prefere viver uma mentira linda no mundo encantado de Oz, Neverland ou Wonderland, não é mesmo? Então, não assuma nada! Eu não estou aqui para isso. Mas quero fazer uma sugestão leia "Thirteen Reasons Why". Coloque-se em cada personagem só por alguns minutos e repense a sua responsabilidade no que ocorre na sua vida e nas vidas que passam pela sua. Só uma sugestão. Só pense!

Parabéns, Netflix! 👏

sexta-feira, 3 de março de 2017

E Assim Nascem Os Fantasmas



Depois de tanto ver filmes, séries, desenhos abordando a história de Ichabod Crane, finalmente li o livro original escrito por Washington Irving em 1820. A história do que, para mim, lembra mais um conto que um romance só se compara ao filme e afins no que diz respeito a ]Ichabod ser um jovem bem atrapalhado.


O texto narra praticamente história do jovem professor de Sleepy Holow, um amante de histórias de terror, sonhador, ambicioso, oportunista, com tiradas ácidas de humor e crítica a sociedade da época. Que deixemos claro pouco mudou desde, então. O texto é curtíssimo, embora bem rico desses detalhes sociais. Acho que Washington Irving foi muito inteligente na construção textual, pois quem ler o livro superficialmente não perceberá as alfinetadas. Teria sido uma tática para driblar as censuras da época? Talvez!



A maioria, hoje, deve chegar ao livro depois de ver o filme do Tim Borton ou de visto a Série Sleepy Holow; e provavelmente esses terão uma sensação de frustração dada a diferença de abordagem dos diretores e roteiristas. Por isso, sejam mais generosos ao lerem a obra de Irving e ampliem seus olhares para os detalhes a margem do mito e assim entenderão porque esse romance inspirou tantas versões e visões diferentes.


O desfecho do livro é interessante. Primeiro, porque evidências nos leva a pensar em X, mas não nos deixa de levantar a possibilidade de Y e Z também fazerem sentido em relação a Ichabod e o fantasma. Ora, trata-se de um vilarejo cheio de lendas e histórias de e sobre pessoas com passados envoltos em segredos. Uma ambientação propícia para mentes imaginativas criarem novas lendas e outros mitos. Mesmo que seja só um desdobramento de um outro mito já existente.



Até o próximo! 



quarta-feira, 22 de fevereiro de 2017

Um título, Uma Capa e o Tempo Errado



Numa feira de livros um título e uma capa me encantam. Mas foi um encanto de tal forma que não li nem o resumo, nem a crítica, nem nada do livro, comprei-o cegamente. E assim foi que o livro “A Menina Que Colecionava Borboletas” de  Bruna Vieira, veio parar na minha estante. Tudo estaria perfeito se não fosse o distanciamento de realidade entre a autora e eu. Explico-me.

É inegável o talento da autora para crônica. Elas são lindas, cheias de sentimentos, lineares, gostosas de ler. E eu simplesmente amo narração em primeira pessoa que me dá a sensação de emoções mais intimistas. Como se fosse um bate papo entre personagem e eu. Só que, no caso desse livro as crônicas nos remetem a uma espécie de diário onde fica inevitável entender que estamos dialogando com a autora e seus conflitos pessoais. – A autora é uma blogueira famosa com zilhões de fãs e seguidores. E esse formato de diário já é algo que ela lida muito bem. – Porém, ela fala das crises que está passando ao deixar o mundo adolescente pelo mundo adulto. O livro é de 2014, e ela estava com vinte anos. Bom, eu com quarenta e cinco agora, já tendo passado pelos conflitos que a jovem vem narrando no seu livro e está numa outra fase de conflitos, tenho outra visão de tudo. Então, o livro foi se arrastando depois de um tempo.  Mas se você está nesse momento de transição de adolescência para vida adulta, o livro se tornará uma delicia. Porque houve momentos que eu revivi meus momentos adolescentes e sorri deliciosamente lendo. 

O livro é de uma editora que eu não conhecia Gutenberg e fiquei muito apaixonada pela formatação e zelo da editora com a autora e sua obra. Parabéns a toda equipe de edição. Isso é estimulante para conhecermos outros livros de vocês. 

Sobre a autora ela lançou outros trabalhos que, pelo que entendi, segue essa linha diário em crônicas e contos. Seus outros títulos são: “Depois dos Quinze”. E há também uma série de ficção chamada “Meu Primeiro Blog”, cujo volume 1 já foi lançado por essa mesma editora. Mas para quem gosta de seguir as celebridades virtuais, ela está em toda rede social e tem o blog chamado “Depois dos Quinze”.  

Indicar ou não indicar? Indico para todas as jovens que procuram se entender ainda. Indico para todos os jovens que estão nesse momento de mudança. Indico a quem quer uma leitura gostosa e rápida, livre das entrelinhas e sub-textos de interpretação profunda e filosófica. E para todo jovem que curte essa linha “Meu diário” de escrita. Acho que é uma escritora que vocês jovens gostarão. Como professor, acho bacana como leitura instrumental. Já os mais velhos que, como eu estão em um foco diferente dentro da literatura, não acho que prenderá a atenção por não fazer parte de nossas buscas e anseios literários.

Crônicas Que Mais Gostei No Livro

Enquanto Valer a Pena
O Futuro Que Você Nunca Viu Na Gente
Tudo Aquilo Que Eu Nunca Te Disse
Um Errinho
O Amor Que Eu Inventei
De Madrugada
Até
O Dia Em Que Eu Me Apaixonei Pela Liberdade

Enfim, é isso! E até o próximo!!!

quarta-feira, 8 de fevereiro de 2017

Morangos Mofados: o Fim.



E com dó e dor me despedi de um livro que busquei por tanto tempo e acabou chegando de surpresa de aniversário. E o que dizer do conto título desse livro? Eu não sei exatamente. Chorei. Mas não sei se foi choro de tristeza porque chegou o fim da linha ou se chorei porque também sinto em mim o mesmo câncer que o personagem. Acho que chorei porque o livro todo mexe nas lacunas que carregamos. Ele veio desde o início me desconstruindo e no final quando eu era pó revirado, ele me fez renascer para uma nova consciência do ato de escrever. Desde o porquê até a a responsabilidade com quem lê. Nunca me vi escritora, embora sempre ouvisse que sou boa nisso. Mas agora sinto que ninguém foge desse dom. E inevitavelmente temos que escrever os sentimentos e emoções que nem sempre são nossas, mas que nos são doadas diariamente pela vida. O escritor tem o dever de dizer o que a maioria não consegue. Então, entendi que é por isso que quando falo tudo meio confuso a quem me ouve, mas quando escrevo toco naquele profundo que faz o outro chorar, suspirar, sorrir, se identificar, me ver…

Ninguém entra no universo de Caio Fernando e sai dele da mesma forma. E estranhamente enquanto escrevo isso penso: alguém sai do universo de alguém exatamente como entrou? Não! Somos canais. Todos nós e cada qual transforma o outro com as armas que tem.

Caio me transformou numa deia de escritora melhor. Digo ideia porque não sei se consigo ainda olhar para mim como escritora, mas sei que sinto que meus olhos e pensamentos não seguem o fluxo da maioria. E cada delírio meu diante de algo visto ou vivido nada mais é que o momento de conceber algo que alguns chamarão de literatura. Ou como diz o próprio Caio Fernando numa carta que ele escreveu a José Márcio Penido onde ele fala do processo de criação, eu entendi que “escrever é enfiar o dedo na garganta”.

Toda pessoa que se diz LEITOR, tem por obrigação ler essa obra. Tem que provar o mofo dos morangos e morrer de câncer para renascer essa outra coisa que sinto aqui agora em mim. Tem que provar “disso”. Eu não sei definir, mas é uma coisa que inexplicavelmente precisa ser vivida. E então, no fim do livro com dó e dor entender que de alguma forma você é parte de um processo que não finda nunca mas que é de extrema importância estar dentro, fazer parte, sentir o movimento chacolhar-nos como coqueiros nas tardes de ventania de verão. Entende? Talvez não ainda. Mas entenderá quando ler. E aí você fará parte dessa coisa de que falo e que agora você só sente como uma viagem minha, particular.


Maravilhoso. É só isso que posso usar para definir “Morangos Mofados”. Maravilhoso. Ma-ra-vi-lho-so! 


segunda-feira, 30 de janeiro de 2017

Sobre Morangos



Quando comecei a leitura da segunda parte de “Morangos Mofados” pensei que leria textos ainda mais poéticos, mais líricos, suaves… A ideia de que os “morangos” escorregariam pelos meus pensamentos trazendo-me frescor e leveza para os dias, foi para o ralo no primeiro conto.

Na verdade os “morangos” despertam em nós uma fome louca de pensar e revira-nos o estômago em centenas de experiências que comodamente deixamos esquecidos no inconsciente. Eles travam na boca com um gosto amargo. E descem rasgando abrindo velhas feridas. (Ao menos foi assim comigo!)
Eu estava em cada conto lido. Um pedaço de mim tatuado em cada um deles. Na solidão do espelho, no passeio de carro, na inocência perdida, nos quadros, nos medos, nas dúvidas. E de repente, eu mesma era Caio Fernando de forma íntima e dolorosa. Eu sentia cada momento na minha própria pele, cada conflito, cada febre. Acho que os morangos ressuscitaram cada um dos meus moinhos de vento com os quais batalhei toda uma vida e eu me vi revirando-me toda intensamente.

Contudo, em momento algum tive pena de Caio ou de mim. Nem mesmo aquela vontade tão corriqueira de chorar o que seria lógico naquele momento. Eu deveria ter chorado, chorado, chorado… até esgotar de mim tudo aquilo que se remexia e doía em mim e em Caio. Mas eu não tive dó de nós dois. Porque esses personagens que circularam por mim e Caio é que nos fizeram o que somos. Ele foi grande porque tinha esses personagens para provocar-lhe a essência poética. E eu, tornei-me essa torre agigantada e para nessa coisa meio poeta e louca que sou.

Tinha, pois, a cada leitura a ilusão de andar num trem cada vez mais descarrilhado partido de não sei onde e indo para uma certeza de infinito que nunca se findará porque sempre virá um novo personagem. E eu lia, lia, lia… Porque já não era mais Caio era eu olhando da janela aquelas paisagens de passado ou de borrão futurístico. Meu Deus! Que sensação impressionante! Quantos sentimentos intensa e insanamente confusos.

Não, senhores, ler os “morangos” não foi fácil que o “mofo”! Definitivamente foi dolorido. Sadicamente prazeroso. Mas li-os, ou os engoli, um a um. Saboreando o amargor como quem espera nisso algum tipo de redenção ou salvação. Então, não pude desmembrá-los como fiz com a primeira parte. Não dá! Os morangos são um monobloco sensitivo. Só existem assim unidos, intrincados.

Contudo, penso que entendi Caio Fernando como nunca entendera antes. Entendi todos os outros que li antes desse. Eu furei a fila, sabe? Minha relação com ele tinha que ter começado aqui. Para depois vir “Os Dragões Não Conhecem o Paraíso”, “Onde Andará Dulce Veiga”, “O Triângulos das Águas”, “Ovelhas Negras”… Hoje, não sou mais uma leitora de Caio Fernando. Hoje, sou uma parte dele. Uma parte que sobreviveu.

Talvez seja assim que os artistas se eternizam. As pessoas se identificam com o que leem, visualizam, tocam… E eles sobrevivem ao seu tempo e a todos os tempos que virão. Imortais enquanto seus sentimentos existirem em algum fã. Eternos na identificação do outro na sua própria dor, alegria, ódio, amor…

Ah, que ilusão e surpresa foi essa de achar que os Morangos seriam mais fáceis e doces. Que paixão me despertaram ser aqueles personagens e o reencontro com os meus próprios. E agora serão os dois. Unidos os Morangos e o Mofo que me esperam na terceira parte. E que será que REALMENTE me espera lá? Não sei! Mas antes de ir até eles, vou respirar um pouco e beber um vinho.


Até breve.

Waleska Zibetti


segunda-feira, 26 de dezembro de 2016

Morangos Mofados – Parte I: O Mofo



Conto 1: Diálogo

Tudo é simples. A tal complexidade das coisas somos nós quem criamos com nossa eterna mania de procurar um porquê para tudo. Nem tudo tem porque e é porque deve ser. E amar alguém é simples como o ato de piscar os olhos. 

É desse “complicar o simples” que Caio fala nesse primeiro conto. E será que um dia chegamos a um ponto que esses porquês desaparecem? Caio também responde essa questão de maneira sábia. Mas eu não contarei como, claro!

Conto 2: Os Sobreviventes

Lembrei-me demais de James Joyce em “Monólogo de Molly Bloom” ao ler esse conto. Ri, chorei, odiei e me identifiquei com a personagem em crise. Mas que fique claro que não é um monólogo. É que ao ler imaginei-me no lugar dela conversando da minha própria vida com um de meus fantasmas. Coisa minha!

O conto é poético e lindo – Falar que Caio Fernando é lindo me parece tão pleonástico -, mesmo dentro dos tons ácidos e irônicos que carrega. Vou deixar-lhes o trechinho do conto que mais gostei. 

“Ah, passa devagar a tua mão na minha cabeça, toca meu coração com teus dedos frios, eu tive tanto amor um dia, ela para e pede, preciso tanto tanto tanto, cara, eles não me permitiram ser a coisa boa que eu era...”
(Caio F. Abreu, in “Os Sobreviventes”)

Conto 3: O Dia Em Que Urano Entrou Em Escorpião (Velha História Colorida)

Estranhos personagens compondo outro cenário cotidiano. Tão caótico quanto pode ser o cotidiano moderno. E tão egoísta, também. Quatro indivíduos em uma única sala evitando-se em assuntos desconexos ou tentando fazer com que suas próprias questões sejam tratadas como prioritárias ou pelo menos urgentes necessidades. O clima do terceiro conto inicia-se mais ou menos assim “Farinha pouca, meu pirão primeiro”.

Mas quando se tem alguém determinado a convencer o outro de uma ideia tudo pode acontecer. Desde nada mudar até uma outra realidade começar, não é mesmo? E no conto de Caio... 

Trechinho...

“...ela lia muito, e quando contava uma história nunca sabia ao certo onde a teria lido, às vezes não sabia sequer se a tinha vivido ou não lido...”
(Caio Fernando Abreu, in “O Dia Em Que Urano Entrou Em Escorpião”)

Conto 4: Pela Passagem de Uma Grande Dor

Sabe aquelas histórias que nos fazem revirar e repensar o profundo de nós, nos fazendo miúdos diante do gigante e vasto universo que há por detrás da porta? Esse conto é dessas histórias. A ausência de nome para os personagens ou qualquer outro tipo de característica nos faz ainda mais íntimos deles. Houve aquele momento em que eu era ela querendo ele e outros onde eu era ele num conflito entre querer ficar só e a querer por perto. Pensei, então, em Nietzche: É difícil viver com as pessoas porque calar é muito difícil. 

Olhem que delicia de trecho:

“Imóvel assim no meio da casa, o som desligado e nenhum outro ruído, era possível ouvir o vento soprando solto pelos telhados”
(Caio F. Abreu, in “Pela Passagem de Uma Grande Dor”)

Conto 5: Além do Ponto

Parei dez minutos para tomar ar. Eu precisava disso depois que li o título do próximo conto. O motivo é que esse fora o primeiro encontro entre Caio e eu. Como se não bastasse, o personagem desse conto “é” alguém que eu amei demais. Confesso que quase pulei a leitura. Mas Caio não merecia isso. “Ele” não merecia isso. Eu também não merecia. Então, parei os dez minutos para tomar coragem e voltei depois quando reencontrei dentro de mim a paz que é preciso para ler. Volte e entrei na chuva indo ao encontro deles (Personagens da ficção e personagens do meu passado).

O conto “Além do Ponto” é o conto mais asfixiante que já li. E essa impressão foi a mesma que tive na época da faculdade. Nada mudou em mais de vinte anos passados desde a primeira leitura. Delirante, sufocante, angustiante e... catártico. É para ser lido com goles de vinho numa noite de frio e chuva; ao som de algo como um blues ou um bolero. “Além do Ponto” é uma travessia e o ponto de chegada é o sentir. 

Desculpem-me, mas não haverá trechos dessa vez.

Conto 6: Os Companheiros

Uma porrada no meio do olho vinda de repente de não se sabe onde deixando tudo desconexo. Li três vezes e a cada vez que relia terminava tão perdida e perplexa quanto a vez anterior. Então, dei-me uns dias. Vinha meio desembalada, faminta... Sei lá! E retornei a leitura do zero. E aí... Nada mudou!A sensação era de cair no caos de braços abertos tentando me agarrar em um fio sensório qualquer que não veio. Acho que esse conto são peças de um jogo de montar. E você vai montá-lo trinta vezes e cada vez será a primeira. Simples assim!

Trecho...

“... aquele que muito fora amado e ferira fundo de faca a quem o amou: permanecia mudo parado suspenso entre várias coisas que já não eram e outras tantas que poderiam vir a ser, ou não.”
(Caio F. Abreu, in “Os Companheiros”)

Conto 7: Terça-feira Gorda

Deus quanta tristeza!  Por que? Por que? Quem determinou que isto ou aquilo é o certo? Não perguntem! Leiam! Repensem! Leiam e respondam: Por que? Deus quanta tristeza! 

Trecho...

“A gente queria ficar apertado assim porque nos completávamos desse jeito, o corpo de um sendo a metade perdida do corpo do outro. Tão simples, tão clássico”
(Caio F. Abreu, in: “Terça-feira Gorda”)

Conto 8: Eu, Tu, Ele

Encaixei-me nesse conto. Não como uma quarta parte, mas como sendo alguém em cujo essa tríade existe e se confronta tanto quanto. Uma ponta sustentando a outra num quase equilíbrio. Algumas vezes, perguntaram-me quantas sou eu. Nunca soube a resposta. Mas sei que, como Caio, quase todos os meus lados são incompreendidos.

Trecho...

“... vê se me entendes: ele não se agasta, mas é dentro dele que eu me afasto. Dentro dele, eu espio o de fora de nós. E não me atrevo.”
(Caio F. Abreu, in “Eu, Tu, Ele”)

Conto 9: Luz e Sombra

A música ao fundo era “Stand by Me” nessa nova e divina versão de Florence and The Machine; e o calor carioca escaldante de um quarto onde eu me encontrava deitada era o cenário da leitura do último conto dessa primeira parte de “Morangos Mofados”.

A angústia da personagem foi crescendo em mim. Ele – Caio – falava comigo e eu solidária, solicita, dedicada respondia carinhosa e ternamente atenta a cada “Você me entende?”; na tentativa inútil e desesperada de que ele soubesse o quanto eu o entendia e o sentia naquele momento. 

Terminei o conto com lágrimas e apertei o livro contra o peito. Mãe agradecida querendo mimar o filho por ele ter me deixado estar com ele ali naquele quarto dividindo comigo suas angústias, medos, dúvidas e poesia. 

Trecho...

“O dia está muito quente. Quando a tarde avançar, sei que me encontrará sentado no degrau. E depois que o cinza tiver se transformado em rosa e em violeta e em azul profundo e por fim em negro, sei que estarei parado no centro daquele quarto, ouvindo os guinchos estridentes e o bater de asas dos morcegos. Gritarei, então. Muito alto, com todas as minhas forças, durante muito tempo. Não sei se foi esta a ordem, se será assim o depois. Mas sei com certeza que nem você nem ninguém vai me ouvir”
(Caio F. Abreu, in “Luz e Sombra”)

Nota: 

Caio Fernando Abreu escreveu o livro original “Morangos Mofados” em 1982 e o revisou em 1995. Se ficou melhor ou pior que o original, eu não sei. Só sei que o Caio é Caio e eu o amo incondicionalmente!

Até o próximo!

Beijos da Wal. 

sábado, 17 de dezembro de 2016

Um Oceano Inesquecível

 INEXPLICAVELMENTE INCRÍVEL essa é a única forma que encontro para falar De “Um Oceano no Fim do Caminho”. Eu não sei nem por onde começar a falar desse livro de tão perfeito que ele é. Eu só posso dizer que você tem que lê-lo. Tem que viajar e sentir cada pedacinho do trajeto dessa história que nos leva a emoções diversas a cada linha. 

Eu, que há tempos não me apaixonava por um livro. Li este como se ele fosse se esgotar no limiar do amanhecer. Li-o em vinte e quatro horas. Li-o muitas vezes de respiração suspensa. Li-o sem notar que ria, falava e chorava muitas vezes sozinha. Li-o como uma mulher de quarenta e tantos e como uma menina de sete anos. Li-o como quem já realizou tudo e como quem precisa realizar um oceano de coisas ainda. Li-o porquê lê-lo tornou-se uma necessidade urgente pouco depois de duas páginas. E você deve fazer o mesmo e mergulhar sem limites numa das aventuras mais apaixonantes da literatura moderna.

“Um Oceano no Fim do Caminho”, é o tipo de livro que não adormecerá nunca dentro de nós depois de ser lido. E certamente será um caminho a percorrer novamente de tempos em tempos como um retorno aos mais puros sentimentos que temos. 

Quero conhecer mais desse escritor. Ele me trouxe de volta a paixão que só sentira antes pelo inesquecível Caio Fernando Abreu. Só ele tinha me feito devorar histórias com a fome que devorei “Um Oceano no Fim do Caminho”. Como maneira de estimulá-los a ler e sonhar com esse livro, vou deixar-lhes com algumas citações que destaquei, porque não sei como mais poderia falar dessa obra prima de Neil Gaiman sem me tornar repetitiva ou uma espécie de fã fanática. 

1- “Quando envelhecemos, ficamos iguais aos nossos pais; viva o suficiente e verá os rostos se repetirem com o tempo”

2- “Eu fui o primeiro livro dela” (Já se imaginou como livro? E mais, já se imaginou sendo lido por alguém. É muito poético isso!)

3- “__ Sinto muito – lamentou Lettie. Nós andávamos sob um dossel de macieiras em flor, e o mundo cheirava a mel. – Esse é o problema com as coisas vivas. Não duram muito. Gatinhos num dia, gatos velhos no outro. E depois ficam só as lembranças. E as lembranças desvanecem e se confundem, viram borrões...”

4- “Adultos seguem caminhos. Crianças exploram. Os adulto ficam satisfeitos por seguir o mesmo trajeto, centenas de vezes, ou milhares...”

5- “Ninguém realmente se parece por fora com o que é de fato por dentro. Nem você. Nem eu. As pessoas são muito mais complicadas que isso. É assim com todo mundo”

6- “Os adultos também não se parecem com adultos por dentro. Por fora são grandes e desatenciosos e sempre sabem o que estão fazendo. Por dentro, eles se parecem com o que sempre foram. Com o que eram quando tinham a sua idade. A verdade é que não existem adultos. Nenhum, no mundo inteirinho”.

7- “... quando você tem sete anosa beleza é uma abstração, não um imperativo”.

8- “Nada nunca é igual – respondeu ela – Seja um segundo mais tarde ou cem anos depois. Tudo está sempre se agitando e se revolvendo. E as pessoas mudam tanto quanto os oceanos”

9- “Não se pode saber tudo”

10- “Não existe passar ou ser reprovado em ser uma pessoa, querido”

Enfim, eu suplico a você: LEIA ESSE LIVRO. Você precisa descobrir esse oceano onde todos que o leram estão. 

Beijos da Wal! 

sexta-feira, 16 de dezembro de 2016

O Homem e Seus Demônios – Fernando Risch



Esse livro me apareceu como indicação pelo Facebook e tanto título quanto sinopse me chamaram muito a atenção. E tratei logo de incluí-lo em minha lista. O autor do livro é o gaúcho Fernando Risch nascido em 1989 em Bagé. Fernando é formado em Jornalismo e Marketing e também atua como radialista e escreve crônicas esportivas para a ESPN. Bom, confesso que não o conhecia o que aumentava minhas expectativas em relação ao romance.

O livro conta a história de Farris Knox escritor que explode após a publicação do seu primeiro romance e todos os conflitos que vieram: desde a fonte de inspiração para esse primeiro livro; passando pela pressão da editora para um segundo livro; a Síndrome do Vazio – terrror de todos os escritores; até as dúvidas geradas pelo sucesso.

F. Knox, simples funcionário de uma pequena fábrica de sabão, com uma vida tão corriqueira e pequena como poderia ter qualquer um; em meses torna-se um milionário e cobiçado escritor de Best Seller. E é aí que a grande sacada do livro vem à tona: encontros ocasionais entre ele e seus "mestres". Knox encontra-se ao longo do romance com George Orwell, Charles Bukowski (O melhor dos encontros), Ernest Hemingway, F. Scott Fitzgerald, Edgar Allan Poe e José Saramago (O segundo melhor encontro). Seria tudo loucura de um homem fragilizado e agora pressionado ou será esse o caminho que ele decidiu percorrer para reencontrar o seu processo criativo? Leiam e descubrirão!


O livro é, sem dúvida, uma grande surpresa! Não me decepcionou. Pelo contrário, deu-me vontade de ler o segundo romance do escritor "Hotel California". A única coisa que, se eu pudesse, eu diria ao autor é para que pedisse uma nova revisão a sua editora porque há pequenos erros que nos causam estranhamento durante a leitura levando-nos a quebra de fluidez da mesma. Tirando isso, o livro é imperdível e Fernando Risch será indubitávelmente um nome que ouviremos muitas vezes dentro da literatura brasileira. Talento e criatividade ele já provou que tem.

Fica aí a dica e até a próxima!

Beijos da Wal.  


Algumas Citações do Livro:

1- "Só pode ser feliz de verdade aquele que arrisca viver, pois a felicidade, assim como a tristeza, pode ir e vir a qualquer momento, e só quando experimentamos um desses sentimentos podemos alcançar o outro".

2- "Quantos outros não pararam no caminhos sem desfrutar do deleite de tornar-se aquilo que tanto queriam?"

3- "Há apenas duas formas de evoluir: ou se aprende com os erros, seja não os repetindo ou alterando suas falhas; ou se supera os traumas, lançando-os à deriva no mar dentro de uma garrafa selada".

4- "Um passo à frente é tão importante quanto não voltar".

5- "Quem se acostuma com a mentira sabe manejá-la com maestria".

6- "Um homem só pode ser feliz gozando da liberdade".

7- "... enterrar o próprio filho, a maior hecatombe que se pode afligir a um ser humano. Os pais jamais deveriam enterrar seus filhos". 

8- "Quando se é solitário e a única pessoa que lhe traz afeto se vai, há o desesperado sentimento de que nunca mais voltará a vê-la e seguirá sozinho para sempre".

9- "A cerveja entra, o ego infla e o remorso se vai. No outro dia o remorso volta, mas isso é problema do outro dia". 

10- "Em se tratando de exaustão, o cansaço pode nos afligir de várias formas, entre elas, o tédio".

terça-feira, 13 de dezembro de 2016

Eu, Poirot e Ms Marple.


Olá, seguidores queridos do CLV! Todos bem? Claro que sim! Eu andava com saudade de estar aqui, mas a vida infelizmente, às vezes, nos pede dedicação total e exclusiva. E foi o que aconteceu. Um agravante da situação é que preciso agora de óculos para poder ler – coisas da idade: uma tal vista cansada. Custei-me a adaptar-me a essa coisa e ler tinha virado quase um desprazer. Pode isso? Pode! Acredite-me: pode sim! Mas como diz a canção o tempo passa e eu me adaptei finalmente recobrando minha rotina de leitura. Bom, deixemos minha nada mole vida de lado e vamos falar de minhas recentes leituras. 

Decidi começar com a Rainha Master dos Crimes a Senhora Agatha Christie. Desde de minha adolescência eu me encanto com a genialidade dessa escritora para o estilo. Há outros, claro! Mas há algo na narrativa de Lady Agatha que me deixa... apaixonada. É! Esse é o termo. Eu ganhei o livro “Um Corpo na Biblioteca” de aniversário e decidi retomar minhas leituras por ele. O título me levou de imediato a pensar no famoso jogo “Detetive”. Já jogaram? Apesar de gostar tanto da escritora, eu só conhecia as aventuras do Poirot. Adorava viajar com ele em suas investigações quando tinha 13, 14 anos de idade. Cheguei mesmo a pensar em entrar um dia para a Scotland Yard, acreditam? (Acho mais charmosa que a CIA.) Enfim, delírio adolescente à parte foi com imenso prazer que comecei o livro na esperança de reencontrar-me com o Inspetor de bigodes grossos. Infelizmente o encontro não se deu. A história seria investigada por Miss Marple. 

Decepção superada, segui a leitura. 

SOBRE O LIVRO:

Uma grande surpresa espera o casal Bantry numa manhã rotineira em Gossington Hall: um corpo de uma jovem fora encontrado por criados em sua biblioteca. Logo de imediato Ms Marple, famosa por sua fluidez de raciocínio, é chamada ao local por sua amiga e esposa do coronel Bantry, a senhora Dolly Bantry. A Srª Bantry pareceu-me a principio uma mulher fútil e para quem o corpo trouxera mórbida animação. 

A história se desenrola num enredo muito gostoso de ler – como se pudesse ser diferente em se tratando de A. Christie. Personagens interessantes, com passados misteriosos vão surgindo o que nos conduz a uma crescente curiosidade em relação ao desfecho que é no mínimo, surpreendente.

A DECEPÇÃO

Como eu disse no princípio, eu sou fã de carteirinha de Poirot. Ele nos envolve na investigação, nos carrega com ele pelas cenas dos crimes, nos faz refletir com ele, somos Poirot ao ler Poirot. O mesmo não acontece com Ms Marple. Ela parece ficar muito à margem dos acontecimentos. Como uma sombra que perpassa em segundo plano ao longo do livro. Você deverá que fazer uma investigação solitária e torcer para estar numa linha correta de raciocínio para que esta bata junto com Ms Marple que só passa a atuar efetivamente do livro nas páginas finais. Se fosse para dar nota, eu diria assim: Poirot leva 5 estrelas e Ms Marpel fica com 3. Não! Duas e meia. Isso! Duas e meia. 

CONCLUSÃO

Leiam “Um Corpo na Biblioteca” com todo respeito e amor que Lady A. Christie merece. Porque o livro é muito legal e merece ser lido.  Leia-o, por exemplo, se você estiver naqueles dias de querer que o tempo passe suave sem ficar procurando subtextos de reflexões profunda. Ele é perfeito para férias preguiçosas, dias frios com chocolate quente, domingos entediantes... O prazer é garantido em horas de enorme suspense.  Eu recomendo. Só não esperem muito charme de Ms Marple se, como eu, forem apaixonados por Poirot.

Enfim, até a próxima leitura!